Capítulo 3 – Nada é Por Acaso: Como a Cidade Foi Codificada para Obedecer




Salvador, 10 de Junho de 2035

Na tela do computador da agência, Glória sorria por fora.
A postagem do dia era mais uma imagem otimista da nova Salvador:
uma mãe feliz com o filho numa escola “modelo”, rede pública com QR Code para entrada e pulseira de localização ativa.

— Pelo menos ele está sorrindo de verdade – murmurou para si mesma 

Mas dentro do seu pen drive com os documentos criptografados a realidade era outra, Glória já estava a dois meses dentro da agência, e esse tempo foi o suficiente para ela reunir provas contra Paolo e seu governo. Ela havia documentado todo o esquema: o uso político de dados, o monitoramento emocional dos bairros, a manipulação de redes sociais e a conivência de empresas privadas no controle das reações populares. Os arquivos estavam todos ali: e-mails internos, áudios cifrados, rascunhos de relatórios, imagens de gráficos com projeções de “comportamento baseado em hábitos de navegação” mas todos criptografados.

Foi em uma madrugada fria de junho, no seu quarto frio, que ela acessou o servidor obscuro indicado no bilhete do banheiro.
Após algumas tentativas falhas, a conexão foi aceita.

@axé.zip_logado: Quem é você?”

@JBatista_anonimo: Jornalista, Tenho provas contra Paolo e sua corja, Preciso de ajuda.”

As mensagens seguintes foram frias, rápidas, calculadas, o grupo exigiu que os arquivos fossem enviados criptografados com chaves geradas por eles e Prometeram proteção, mas não prometeram pressa, Disseram que o conteúdo seria validado e conferido e que, quando fosse seguro, seria enviado para ser publicado.

Enquanto isso, Glória sentiu que não poderia ficar parada, então naquela mesma semana, redigiu um texto, ela não podia acusar diretamente mas podia instigar, cutucar e fazer o público pensar.

Há Quanto Tempo Eles Estavam Ouvindo?

Por J.Batista
Em Salvador, nada mais é acidental.

Você já parou para pensar por que certas ideias viralizam e outras desaparecem sem deixar rastro? Por que certas postagens são destacadas pelas plataformas enquanto outras, mesmo com milhares de curtidas, desaparecem do feed?

A cidade entrou num novo ciclo. Mas será que foi por escolha ou por programação?

Há sinais de que o atual regime estava sendo construído há anos.
Pequenos acordos. Projetos-piloto. Disfarces em nome do “progresso digital”.

O que estamos vivendo não começou no Carnaval de 2035.
Começou muito antes, quando entregamos nossos dados em troca de conectividade.
Quando passamos a confiar em promessas tecnológicas sem perguntar quem as programou.

As câmeras nas avenidas não servem apenas para “segurança”.
As redes de Wi-Fi livre não são apenas “inclusão digital”.

O que estamos vendo agora é o resultado de anos de engenharia social.
Mas a pergunta que precisamos fazer é: Paolo e a Prefeitura sabiam disso?

E mais importante: o que ainda estão escondendo?

A cidade que canta está sendo reprogramada.
Mas talvez, só talvez, ainda dê tempo de reinstalar a verdade.


A matéria viralizou dentro das redes alternativas, no subúrbio, nos terreiros, nos grupos de jovens das universidades, nós grupos de resistência, ela se espalhou como fumaça de um incenso: devagar, mas penetrante. Glória assistiu tudo de dentro da agência, com os olhos atentos ao movimento dos grande escalão da agência que estavam tentando entender de onde viera o vazamento.

Mas ela sabia que era só o começo.

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